Filomena Moretti, Asturias - Isaac Albeniz
Acorda
sonordelento o menino, passa cuspe na remela. Abrir os olhos. Inda a voz
rouquenha do guru sertanejo e o responso dos fieis, como vozes vindas do além,
ressoam em sua mente.
Maria valei-me
Aos vossos devotos
Vinde socorrei
Vosso
amor se empenha
Ó Virgem da Penha
Penha onde mora
Na fonte vital.
E o responso em coro:
Na fonte vital
Na fonte vital.
Todo
menino é rei, faz castelos de cristal, encostado
ao muro do quintal. Pensa. Meninpedra, filosofal. Remelento, dedo na mão, esfrega. Tocar terçol. Quenturinha boa pra
curar. Olha o monturo chamusquento. Nojenta
alfurja, onde se joga as imundícies. Restos crus, cozidos,
palhas de grãos, cereais, panos, molambos, penicos de mijo e bosta, pasto de cães, porcos e jumentos, galinhas e urubus. Dava
um fogo quase morto. Fumo subindo, redemoinhos, odores que aos animais
não parecem incomodar. Queima a toda noite, um gosto especial aos restos sapecados, como carne de fumeiro ou moqueada. No fim do
mundo tudo vai pegar fogo, nojento, de
fazer medo. Devia ser de água como se
havia acabado antes. Não, água também é
muito agoniado. A morte vem boiando, zombando da gente. De braços abertos,
estatelada. Pra lá e pra cá. Como bosta n´água. De fogo é melhor. Eterno, transforma,
purifica o homem, um dia tudo será fogo, disse o obscuro Heráclito.O
fogo do inferno, anunciado por Mr. Fanali, sous les toits de Paris. Queima
tudo, até os ossos. Adeus viola. Não vem fazendo careta. Enfurecida. De uma
vez. Mesmo que se corra. Fuçama de noites mal dormidas, canto aos mortos,boates
de cigarros fumegantes entre lábios femininos. Aqui, nem sempre é uma festa.
Mas não é mesmo, Gonzaga? Ô macho, manda esta muié parar qui já tou todo molhado, senão, para o fole Seu Gonzaga, para este fole marvado.
Filomena,
não a Moretti da guitarra em Asturias de Albeniz, a do padeiro do violão, também morena, gamela na cabeça, dar comida
aos porcos, passa. Toca a viola:
- Pensando no fim do mundo? Tu já tem juízo pra pensar?
Tocou na sua matadura. Pôs a viola no saco.
Ouvirá Ana Vidovic na Catedral do paraguaio Agustin, o Mangoré,e se lembrará,
não sem saudade, de não caber dentro de si, não sem saudosismo, não tanto salutar, mas com um pingo de vida
porque como disse alguém, relembrar é viver duas vezes, lembrará sim, de
Lilinha, irmã sua, no violão, nas noites
de Capela. Contraponto aos cagas-sebos no arvoredo, os trinados de sangue,
cabeça de cardeal. Canarim, assanha
sanhaço. Xéxeus xiando sacudidos
nos seus ninhos, como bolsas, de gravetos, pelo vento. Polifonia do sertão,
milho pilando no pilão, manteiga a chacoalhar na cabaça, Mancambira, a
gungunar, remedando caminhão, o
bate-bate na bigorna Zé Cadeira, Zé Ferreira e Tunin Gomes. Bate, bate
coração, bate o ferro na bigorna, bate a seca no sertão. Bate o vento
balançando a cerração. Bate o vento balançado
coração.Quando tu balança, toda a terra dança.
Quando tu balança
Dá um nó na minha pança
Quando tu balança
Dá um nó na minha pança
Madrugada entrando
E o fole gemendo
Poeira subindo
E o suor descendo
Quem não tava "bêbo"
Já tava querendo
E eu cambaleando
Ia te dizendo
Quando tu balança
Dá um nó na minha pança
Quando tu balança
Dá um nó na minha pança
Tava requebrando
E eu naquele jogo
Eu tava me esquentando
Mesmo sem ter fogo
Só batia palmas
De pernas puxada
Como quem atira
Em onça pintada
Quando tu balança
Dá um nó na minha pança
Quando tu balança
Dá um nó na minha pança Mas não é mesmo, Gonzaga? Ô macho, manda esta muié parar qui já tou todo molhado, senão, para o fole Seu Gonzaga, para este fole marvado.
Continuação no livro Noite em Paris, breve nas livrarias.
Nenhum comentário:
Postar um comentário