São
mais ou menos 15 horas. Estou numa destas salas de espera de uma clínica
médica. Como sempre, todos ou quase todos pregados na televisão. Uma epidemia.
Os programas chatos da tarde são vistos e revistos com a paciência de bois que
vão para o matadouro. Um ou outro abre um jornal fastidiosamente, ou lê um
destes romances de 3ª categoria, ou
mesmo um livro espírita, ou os chamados de auto-ajuda. Espírita, acho que é o
daquele fulaninho ali. Lê, Incrível como crêem ser possível atingir o nirvana
com a simples leitura de um livro. E o pior é que teorizam sobre o tema. E
pensam também na imortalidade, como se fosse possível ser Deus sem mais nem
menos.
18.08.2003
– 16:10 - Aquela magricela branquinha, ou amarelinha como gostam de chamar o
negro ao branco, aquela branquinha é tão fina
que se tem medo de, ao tocá-la, desmanchar-se, medo que se transforma em
prazer, se ao invés de quebrar-se, partir-se em duas divinas criaturas.
O
ambiente de um hospital parece frívolo, e talvez o seja, a despeito de as
pessoas estarem na vizinhança da morte. Todos falam ao mesmo tempo e noventa
por cento do assunto, a saúde é o tema. As velhas costumam misturar o terço com
antibióticos, anti-inflamatórios, antidepressivos, anti-tudo. O médico que se
acredita o próprio Deus trata o populacho, apenas como um instrumento por onde
o onipotente opera suas graças. Os santos também operam milagres, embora, eles
mesmos, não tenham curado os males que os levaram ao campo santo ou à imaginada
glória do senhor. A televisão. continua soltando suas notas que atravessam a
sala semi-adormecida. A magrelinha, ao ouvir o chamado do ortopedista, passa por mim como um caniço açoitado pelo
vento. É o mesmo com quem vou me
consultar. Dizer como está minha coluna, após fazer uma série de perguntas
imbecis, porque só depois de fazer todos os exames, vai me
dar um remédio, não obstante, eu reclame
de muitas dores.
Enquanto escrevo estas linhas observo um velho com quem
está a magrelinha, (Saberei chamar-se Angela, após o chamado do médico), me
perscruta. Olhos compridos e interrogadores. Que estará ele escrevendo? Viu-me olhar para ela e sua mãe, já entraram
no consultório. Imagina se soubesse estar sua filha, ou lá o que seja, sendo personagem
deste escrito!. E ele mesmo? Qual seria
sua reação? Aqui o escritor supera ao pintor ou desenhista, pois este é
obrigado a traçar em longas linhas ou
pinceladas a figura que deseja vir a
lume, denunciando, de logo o seu intento. Como filigranas, os dedos de Ângela
atravessa, os longos cabelos finos e
negros, negros, como diria José de Alencar,
qual as asas da graúna. Os pés tão finos quase transparentes despertam
os mais recônditos desejos, (diriam, levantam defunto). Que pensaria o ancião
se soubesse que nestas linhas, neste pedaço de papel amassado está sua filha sendo despida, antes mesmo que
o médico a chamasse e para lá se dirigisse escoltada com muito carinho por sua
mãe? Tu me lembras agora, outra também
magra, branca e gostosa. Conheci-a já lá vão alguns anos. Onde fostes tu,
coragem? Covarde Horus, não a tiveras, deixaste-a cair nos braços doutro. Não, agora me concentrar em ti. Ouvir tua voz, tão diáfana quanto tua pele, deve ser.
Cristalina, suave, sensual. Não penses que me vou apaixonar, pois, anos
curtidos na solidão não fabricam uma paixão
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