Num só pé como a bela Empusa, como Saci-Perêrê,
andou, andou. Aba sui aba supé. No
prego, o pé furou, su alma, enterrado.
Vidrocaco abriu seu pé, no atravessar rua. Teresinha chama, Teresinha. O pé
cortado, curar? Curado, pó de café, curado. Ele apareceu de repente
com uma lupa na mão, colocando em frente a seu rosto, arrastando-o, como a um
sonâmbulo, hipnotizado. Arrastando-o como se arrasta uma zorra. Apelidaram-no
de Boi, não se sabe porquê, e, todos lá no colégio o tinham por boi, sem a
sabença de qualquer outro nome. Dizia, o povo da roça gostar muito dele, porque
não tinha a fiduncia dos doutores da
cidade. Ela era baixinha e tinha um cabelo loiro e um sorriso eterno que se trancou
quando ele disse que a amava. No colégio perceberam, não mais se falavam. Não mais caminhar em
liberdade, té Bruno Seabra, falar,
falavam de tudo e coisa nenhuma. Um vendaval os sacudiu atirando-os longe um do
outro. Neófito nas coisas do amor, não
atinara que um não poderia ser, no futuro um sim. Lhe deu as costas per a
sempre. Agora procura em vão sua beleza, que será certamente como a Duília de lindos
seios que Aníbal viu um dia. Onde estarás, doce
pássaro de minha juventude? Lágrimas vertidas n´escuridão de minh´alma,
fostes em vão. Tempo devora vidas. Ah, trampolinagens nos quintais, vida
menino. Vade se cagou todo, quando a velha Rosalina, segurando-o pelo braço,
começou a bater-lhe. Do pé d´araçá pulei por riba da cerca, sem tempo de
avisar, quando irrompeu, manguá na mão,
por trás das árvores, velha, feia e rabugenta. Joga chapéu, Vade. Ficou chapéu, araçá veio, rolando pelo chão,
cair em minha mão. Solto Vade, ficou o chapéu, denunciador troféu.
Roubados araçás comidos debaixo da
quixabeira, no açude, em terras de Antonio Oliveira. De seus fundilhos, Vade tirava tolocos saídos na
agonia, enquanto a velha lhe batia.
Chapéu prova do crime, denuncia Rosalina, uma sova em cada um, mãe é pra bater,
escola do sofrimento, torna o homem,
homem. Pequerrucho e novo, Subi no pilão. Caído sobre pernas e cabeça. Machuca pilão, cambota
fica. O pé do jegue. Recebi uma patada. Esmeraldo, vai buscar hortelã nas
poças. Nanã machuca hortelã, nos olhos põe, ensanguentados pelo coice. Inda hoje, ninguém desta travessura.
Jumento é bicho manhoso, quando sestra, sai de baixo. Na queda, nem a de
cavalo. Quando o tino vai chegando,
aprende-se a lutar com os bichos,
que mais parece gente, não falam, mas entendem o que se diz. Um pouco, gente.
As fêmeas são até mulher de muito macho, que aprende com elas os segredos da
machice. De vez em quando tem um desastre. Arbino não morreu de jega? Pois
morreu, foi comer, saiu comido, caído, de braga aberta achado, pelo coice, d´ovo inchado. O véi Quinca foi com bezerra, encontrado no curral, ensangüentado.
Quinze dias durou, a conta de contar,
com pejo, o sucedido. O dedo na porca e olho na porta, até estremecer de gozo.
Valdemar mandava buscar espinho de mandacaru pra furar as bolhas de bexiga,
antes que ela o matasse, como matou
Ramsés V e Luís XV, O Bem Amado. Saía-lhe um pus amarelo. Lenço limpando a carupemba.
Sai de perto menino, bexiga pega. Se não chovia, bebia água salobra da presa de Pedro
Carneiro. Na feira, Pedro vendia água de
pote. Está chegado em Capela, meninos
marcham em roda da carnaúba, um tambor marcava passos indecisos. Viu Zé Mancambira no oitão da casa de Lane, última na estrada do Noventa. Arremeda o zunido de um carro. Seu mantra, seu
calmante. Arreliavam dele, em sua capa colonial. Roque de Damião gostava de
fazer medo. o mundo ia acabar. Dona
Juliana gostava de mijar em pé. Abria as
pernas, xíiiiiiii. Não se importava que a gente visse o rego se formar. Canta, canta Maria Pinhão toda tarde, a tarde toda. Roda Pião, roda pião, roda pião. Dona Rola se
irritava com a inticação da Pinhão. Perder seu marido de vez a Pinhão
não leva não. Não chore não, Lé / pra que chorar,
Lé, / a vida é esta / um amar, outro gozar, Lé. As tanajuras,
enquanto vida ainda lhes sobrava, esvoaçavam, esvoaçavam no verão das chuvas
primeiras. Zuuuuummm. Os pernambucanos, calejados da seca, as pegavam,
concorrendo com pássaros e tatus, par
comer assadas. Cortavam-nas pelo abdômen as jogavam na frigideira, com manteiga
ou seu próprio óleo amarelado. Herança de nossos índios e já apreciado por
Anchieta e Gabriel Soares de Souza, chegados numa bundinha de tanajura. Cai,
cai tanajura na panela da gordura! Cheiro
danado. Hoje comprovado, fonte de
proteína mais que o boi, até projetos em estudos de criatório de formigas e
outros insetos. Suprir o mundo de proteína, cada vez mais cara com as carnes
tradicionais. Não dizem que formiga faz bem pra vista, e nunca se viu um
tamanduá de óculos? O povo é sábio:
Não existe
melhor cura
P'ra
doenças de garganta
É bunda de
tanajura
E injeção
não adianta
Sertão,
o flagelo da seca. Morre-se de sede e fome. Estão os homens interessados nisto?
Tão barato um poço artesiano. Não, o dinheiro é só pras
orgias, metrôs, campos de futebol. Grandes obras enriquecem. Mais empresários
que políticos, pobre paus-mandados. Daniel aleijado trabalhava na semana e nos
dias de feira pedia esmola. Mordendo a língua
concertava arreios, fazia bainhas. Facas, facões, punhal e punhaletes.
Vindo d´aroeira, criou filhos, com exemplo de coragem e abnegação. Cirilo remendava sapatos, rindo a morrer do sucesso triste. Só
se ria de miséria. Um Diógenes remendão se rindo da miséria do sertão. Que mal
havia no mundo que não fosse pra purificação do homem? Não se chora do mal, ele
é nosso mestre. Quem com ele não
aprende, com mais nada aprende. Melhor a loucura que o prazer, embebedar-se com
o prazer escurece a mente e nos deixamos dominar pelos mais fortes e mais
sagazes; Da vida só precisamos viver, melhor viver entre corvos que entre
bajuladores. Os corvos só comem os mortos; bajuladores devoram os vivos. Ri é o
melhor remédio. Mata tua angustia e a do próximo. Cínico ou estoico tu Cirilo ensinastes até a quem não
imaginastes ter como aluno. N´Aroeira, Pedro Marcilio, vaqueiro, pega boi no calumbi. Toda feira bebia, a feira toda. Enciumada de
Angerca, Pedro Marcilio furou, com
peixeira na barriga, corria
Constança, gritaria, bofe e tripa segurando. Pedro Marcílio afamado, vaqueiro, dele
diziam, caparia de um só golpe, um cabra de Lampião. Dona Oláia fazia suas
lapinhas imitadas, mas não igualadas.
Dézinha gritava sua dor, olhos negros sobre todos. Medo? ou
proteção querias? O povo, sim, tinha medo. Alma penada no
mundo. Encosto de noivo morto. Paixão. Fuga de noivo, na lua cheia, na garupa traçoeira do
alazão, amiga leva. Encarnação do tinhoso. Se fosse na Idade
Média, os padres já a tinham queimado,
como se queimou Joana D´Arc, depois virada santa. De possuída a santa.
Dizia falar com Deus. Quem és tu pecadora, pra falar com Deus? Dos mais santos poucos papearam com ele. E tu presunçosa, blasfemas contra o senhor,
dizendo conversar com ele? O que tu ouves? Não é mesmo, a voz de Belzebu,
fingindo-se de Deus?
Continuação no livro NOITE EM PARIS, breve nas livrarias.
Continuação no livro NOITE EM PARIS, breve nas livrarias.
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