terça-feira, 12 de abril de 2016




















Num só pé como a bela Empusa, como Saci-Perêrê, andou, andou. Aba sui aba supé. No prego, o pé furou,  su alma, enterrado. Vidrocaco abriu seu pé, no atravessar rua. Teresinha chama, Teresinha. O pé cortado, curar?  Curado,  pó de café, curado. Ele apareceu de repente com uma lupa na mão, colocando em frente a seu rosto, arrastando-o, como a um sonâmbulo, hipnotizado. Arrastando-o como se arrasta uma zorra. Apelidaram-no de Boi, não se sabe porquê, e, todos lá no colégio o tinham por boi, sem a sabença de qualquer outro nome. Dizia, o povo da roça gostar muito dele, porque não tinha a fiduncia  dos doutores da cidade. Ela era baixinha e tinha um cabelo loiro e um sorriso eterno que se trancou quando ele disse que a amava. No colégio perceberam,  não mais se falavam. Não mais caminhar em liberdade, té  Bruno Seabra, falar, falavam de tudo e coisa nenhuma. Um vendaval os sacudiu atirando-os longe um do outro. Neófito nas coisas do amor,  não atinara que um não poderia ser, no futuro um sim. Lhe deu as costas per a sempre. Agora procura em vão sua beleza, que será certamente como a Duília de lindos seios que Aníbal viu um dia. Onde estarás, doce pássaro de minha juventude? Lágrimas vertidas n´escuridão de minh´alma, fostes em vão. Tempo devora vidas. Ah, trampolinagens nos quintais, vida menino. Vade se cagou todo, quando a velha Rosalina, segurando-o pelo braço, começou a bater-lhe. Do pé d´araçá pulei por riba da cerca, sem tempo de avisar,  quando irrompeu, manguá na mão, por trás das árvores, velha, feia e rabugenta. Joga chapéu, Vade.  Ficou chapéu, araçá veio, rolando pelo chão, cair em minha mão. Solto Vade, ficou o chapéu, denunciador troféu. Roubados  araçás comidos debaixo da quixabeira, no açude, em terras de Antonio Oliveira. De seus  fundilhos, Vade tirava tolocos saídos na agonia, enquanto a  velha lhe batia. Chapéu prova do crime, denuncia Rosalina, uma sova em cada um, mãe é pra bater, escola do sofrimento, torna o homem,  homem. Pequerrucho e novo, Subi no pilão. Caído  sobre pernas e cabeça. Machuca pilão, cambota fica. O pé do jegue. Recebi uma patada. Esmeraldo, vai buscar hortelã nas poças. Nanã machuca hortelã, nos olhos põe, ensanguentados pelo coice.  Inda hoje, ninguém desta  travessura.  Jumento é bicho manhoso, quando sestra, sai de baixo. Na queda, nem a de cavalo. Quando o tino vai chegando,  aprende-se  a lutar com os bichos, que mais parece gente, não falam, mas entendem o que se diz. Um pouco, gente. As fêmeas são até mulher de muito macho, que aprende com elas os segredos da machice. De vez em quando tem um desastre. Arbino não morreu de jega? Pois morreu, foi comer, saiu comido, caído, de braga aberta  achado, pelo coice, d´ovo inchado.  O véi Quinca foi com  bezerra, encontrado no curral, ensangüentado. Quinze dias durou,  a conta de contar, com pejo, o sucedido. O dedo na porca e olho na porta, até estremecer de gozo. Valdemar mandava buscar espinho de mandacaru pra furar as bolhas de bexiga, antes que ela o  matasse, como matou Ramsés V e Luís XV, O Bem Amado. Saía-lhe um pus amarelo. Lenço limpando  a carupemba.  Sai de perto menino, bexiga pega. Se não chovia,  bebia água salobra da presa de Pedro Carneiro. Na feira, Pedro  vendia água de pote.  Está chegado em Capela, meninos marcham em roda da carnaúba, um tambor marcava passos indecisos.  Viu Zé Mancambira  no oitão da casa de Lane, última  na estrada do Noventa. Arremeda  o zunido de um carro. Seu mantra, seu calmante. Arreliavam dele, em sua capa colonial. Roque de Damião gostava de fazer medo.  o mundo ia acabar. Dona Juliana gostava de mijar em pé.  Abria as pernas, xíiiiiiii. Não se importava que a gente visse o rego se  formar. Canta, canta  Maria Pinhão toda tarde, a tarde toda. Roda Pião, roda pião, roda pião.  Dona Rola se  irritava com a inticação da Pinhão. Perder seu marido de vez a Pinhão não  leva não. Não chore não, Lé / pra que chorar,  Lé, / a vida é esta / um amar, outro gozar, Lé. As tanajuras, enquanto vida ainda lhes sobrava, esvoaçavam, esvoaçavam no verão das chuvas primeiras. Zuuuuummm. Os pernambucanos, calejados da seca, as pegavam, concorrendo com pássaros e tatus,  par comer assadas. Cortavam-nas pelo abdômen as jogavam na frigideira, com manteiga ou seu próprio óleo amarelado. Herança de nossos índios e já apreciado por Anchieta e Gabriel Soares de Souza, chegados numa bundinha de tanajura. Cai, cai tanajura na panela da gordura!  Cheiro danado.  Hoje comprovado, fonte de proteína mais que o boi, até projetos em estudos de criatório de formigas e outros insetos. Suprir o mundo de proteína, cada vez mais cara com as carnes tradicionais. Não dizem que formiga faz bem pra vista, e nunca se viu um tamanduá de óculos?  O povo é sábio:
Não existe melhor cura
P'ra doenças de garganta
É bunda de tanajura
E injeção não adianta


Sertão, o flagelo da seca. Morre-se de sede e fome. Estão os homens interessados nisto? Tão barato um poço artesiano. Não, o dinheiro  é só  pras orgias, metrôs, campos de futebol. Grandes obras enriquecem. Mais empresários que políticos, pobre paus-mandados.  Daniel aleijado trabalhava na semana e nos dias de feira pedia esmola. Mordendo a língua  concertava arreios, fazia bainhas. Facas, facões, punhal e punhaletes. Vindo d´aroeira, criou filhos, com exemplo de coragem e abnegação.  Cirilo remendava  sapatos, rindo a morrer do sucesso triste. Só se ria de miséria. Um Diógenes remendão se rindo da miséria do sertão. Que mal havia no mundo que não fosse pra purificação do homem? Não se chora do mal, ele é nosso mestre.  Quem com ele não aprende, com mais nada aprende. Melhor a loucura que o prazer, embebedar-se com o prazer escurece a mente e nos deixamos dominar pelos mais fortes e mais sagazes; Da vida só precisamos viver, melhor viver entre corvos que entre bajuladores. Os corvos só comem os mortos; bajuladores devoram os vivos. Ri é o melhor remédio. Mata tua angustia e a do próximo. Cínico ou estoico  tu Cirilo ensinastes até a quem não imaginastes ter como aluno. N´Aroeira, Pedro Marcilio, vaqueiro,  pega boi no calumbi.  Toda feira bebia, a feira toda. Enciumada de Angerca,  Pedro Marcilio furou, com peixeira na barriga, corria  Constança,  gritaria,  bofe e tripa segurando.  Pedro Marcílio afamado, vaqueiro, dele diziam, caparia de um só golpe, um cabra de Lampião. Dona Oláia fazia suas lapinhas imitadas, mas não igualadas.  Dézinha gritava sua dor, olhos negros sobre todos. Medo? ou proteção  querias?   O povo, sim, tinha medo. Alma penada no mundo. Encosto de  noivo morto.  Paixão. Fuga de noivo, na  lua cheia, na garupa traçoeira do alazão,  amiga leva.  Encarnação do tinhoso. Se fosse na Idade Média, os padres já a tinham queimado,  como se queimou Joana D´Arc, depois virada santa. De possuída a santa. Dizia falar com Deus. Quem és tu pecadora, pra falar com Deus?  Dos mais santos poucos papearam com ele.  E tu presunçosa, blasfemas contra o senhor, dizendo conversar com ele? O que tu ouves? Não é mesmo, a voz de Belzebu, fingindo-se de Deus?





Continuação no livro NOITE EM PARIS, breve nas livrarias.

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