IDEIA de Juju Róis
Esta manhã eu acordei pensando ser o maior dos heróis, eu nem sei quem eu era exatamente, sei que era muitos e todos, com poderes os mais diversos, mas não era isto o que via. Me via na Rua do Buraco, em Gandu dos jacarés e do Corujão, onde nasci e me arrumando para ir para o Polivalente, onde estudava. Não vou mentir que eu adorasse acordar cedo para ir pra Escola, porque, também quando não tinha aula, eu acordava para trabalhar e eu, na verdade, nem gosto de trabalhar nem de estudar, mas como preciso ajudar nas despesas lá de casa, o jeito é fazer os dois e tentar gostar, tanto de um como de outro. Uma coisa que eu gosto de fazer é quando me dão dinheiro para comprar alguma coisa. Alguém me dava 10 reais. Compre ali um quilo de açúcar e pacote de café. Era o dinheiro certo, mas chorava, pechinchava até o cara deixar por 9 e me dar um realce troco. Por isto, puseram-me o apelido de Zé Pechincha. Eu não me importo, o que importa é que ganhei um real e é assim que galinha enche o papo. O que gostaria mesmo era de ser um mago, estalar o dedo e a coisa aparecia. Mas deixa eu me arrumar um ovo com farinha, café e banana. Aqui em casa nós comemos pouco pão, porquê é caro e mamãe nem sempre grana pra comprar. Eu que trago, às vezes, quando peço pra ajudar na padaria. Cortar, carregar e empilhar a lenha pra não molhar; pô-la no forno, esperar fazer a brasa, encher os cestos, muita coisa, eu gostava muito. Também gostava de trabalhar na saboaria de Seu Almir. Era com lenha também, mas para cozinhar os ossos, apurar o sebo e fazer o sabão. O que eu mais gosto de fazer é ensinar os meninos a fazer ser seus deveres e atividades. Eu descobri que aprendias coisas mais rápido de todo mundo. E foi daí pensei ensinar, inicialmente de graça, depois comecei a cobrar. Os não país não pagar, achando que eu não soubesse da matéria, mas quando mostrei que sabia e que não podia deixar outro trabalho para não ganhar nada, ensinando, eles passaram a me pagar por banca. Muitos me davam os livros e estudava antes toda a atividade e outros assuntos. Havia sempre um que demorava de pagar, mas eu cobrava e eles pagavam. As pessoas me perguntavam como eu aprendia e eu não sabia, apenas dizia que aprendia lendo.
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NA ESCOLA
Acordei cedo, mas terminei chegando atrasado. Aula de História.
A professora parecia não gostar muito de mim.
- Você aí, seu atrasadinho, qual foram os indígenas que comeram o bispo Dom Pêro Fernandes Sardinha?
Me lembrei da piada, mas não quis arriscar ser o engraçadinho e responde firmemente:
- Foram os índios Caetés de Alagoas, professora.
Quebrou a cara pensou que eu não acertar. Não sei porque ela implicou comigo, deve ser porque chego atrasado na primeira aula. Ela não sabe, ou faz de conta que não o sacrifício que faço para estudar. Criado com vó, ainda tenho de cuidar dela antes de sair. Às vezes, na aula, eu me distraio, viajo na maionese, a professora percebe e me pergunta alguma coisa, parece que eu adivinho, eu sempre respondo certo. Todos ficam impressionados, inclusive ela, que tenta me pegar com uma pergunta difícil. Eu não faço porque quero, para abusar, me acontece a distração, as viagens da minha mente. Agora mesmo estava pensando num sonho desta noite. Uns meninos tentavam fazer bullying e tentava bater neles, mas o murro saia tão fraco que ainda mais riam de mim. Eu não posso entender porque acontece isto, eu não tinha medo deles, mas ficava chateado de não poder bater neles, de me faltar forças para bater neles, por isto eu os evitava, não por medo. Os meninos da minha idade sempre falam em namorada, eu ainda não namorei ninguém porque tenho vergonha da minha condição. Elas não gostam de quem faz trabalho braçal, mal sabem elas, que com meu trabalho, faço dinheiro do que a mesada que seus pais lhe dão. Algumas delas chegam a me dizer que gostariam de namorar comigo, mas que seus pais não deixam. Eu não me importo, na rua Manoel Novais, rua da Delegacia, como é mais conhecida, tem uma casa que tem 4 meninas muito bonitas, eu gostaria de namorar com todas elas, mas a timidez não deixa. Mas o que há-de ser, será. É como dizia minha tia Nanã. Eu me lembro muito dela e ela gostava de mim. Muito do que sei agora, ela me ensinou. Quando lhe dizia eu não sei fazer isto, ela dizia, aprenda, fazendo. Sem um começo nada se faz, se errar, faça de novo. Como era sábia!
Amor, se fosse um pum, eu nunca mais te soltaria.