Fedor Ivanovitch Chaliapin, “Minha Vida”. Lê. Um livro e a lembrança do palhaço
Pingo-Pingo. Chaliapin. Minha vocação de
ator? A Marmonov, devo. Jacob Ivanovitch Marmonov. Tinha doze anos quando o vira
atuando, numa barraca de natal. Iachka, (Assim era conhecido em todo volga) cantor
e clown, de meia idade, físico notável, um tanto bojudo, de bigodes negros e
espessos e olhos ferozes, divertia o
povaréu inculto.
Brasil, sem a tradição da Rússia, o mais cabotino pode superar
grandes dos nossos. Isto não impede um palhaço de circo mambembe influenciar
algúem para a arte.
Pingo-Pingo. Quanta ingenuidade, e no entanto, quanto
admirado, por nós crianças e adultos. Foi ele, meu Iachka? Serás lembrado nos camarins da Escola ao se maquiar para um
espetáculo, o professor João Gama corrigindo o exegero. Quem
nunca viu, venha ver - Em coro, a
garotada: Pingo-Pingo vadiar. Oi de lá,
venha ver. Pingo-Pingo vadiar. De
rua em rua, em Capela, seguiam as pernas de pau, anunciando o divertimento. Tinham
entrada garantida. Um homem comum, começava a crescer, (nem precisava as pernas
de pau), com as tintas encombrindo o rosto.
Anos depois vai ouvir. É como se eu fosse deixando de ser Luiz Carlos
Vasconcelos e me tornasse pouco a pouco o Xuxu. Assim nos sentíamos, de cara pintada,
transformados. Orgulho em ser pintado até que nos obrigassem a desfazê-la, sob protestos e choro, a marca de entrada, no
braço, não poderia ser desfeita. Eu, às
escondidas e a contragosto de papai,
seguia o truão, coisa de moleque, dizia. Inveja dos outros. Seus pais não
ralhavam e até gostavam, alguns. Apanhar,
não apanhava. Apanhei pouco. Era só um olhar e tudo parava. Assim, com a bola, em frente a casa de Maria Pinhão. Bola de meia
batendo nas portas ou caindo nos telhados. Era assim, se pegava num badogue. Coisa de malandréu, dizia. Ator, nem em sonhos, nem mesmo sabia o que
era, mas ali, talvez a iniciação. Mistérios dionisíacos. Mais tarde, na
Europa, enquanto lava um prato e outro,
atua. É marroquino e turco. Apache do Tororó, Cavaleiro de Bagdad, indiano e
ciclista no Les Cracks de Alex Joffé com Bourvil, Robert Hirsch e Monique Tarbès, bulletin de
paye, trinta novos francos ao dia, chez Regina. Pierrot em "Amor e Vida de
uma Colombina sem Amor", de Jesus Chediak, soldado e juiz em Exceção e a
Regra Brecht/Hackler and so on. Por minha palhaçada, perdido o papel no seminário, primeira vez no palco,
seria. Aos gritos, caído no palco. Exagero.
Os frades o mandaram descer. Primeira decepção. Horus, espera tu hora. Da. Vem, vamos embora, que esperar não é saber, Quem sabe faz a hora, não
espera acontecer. Vandré. Onde estás agora? Meu coração chora. Onde te
levaram as torturas? Primeiro de abril, a caminho da escola. Tanques cercavam a
Faculdade. Voltou correndo. Queimam, os estudantes, jornais. Gritos na Praça
Municipal. Manifestações. Polícia. Cassetes e cachorros, o couro come. Correr. Entrou na Confeitaria Colombo, atravessa o balcão,
finge-se de garção. Que Manolo não me ponha
porta a fora. Policia socando o cacete na estudantada. Se já tinha vontade de vazar
daqui, agora mais do nunca. O último a sair apague a luz. Meninpedra rola,
mas não faz limo.
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