Aloisio Leal, todo solícito a seus pedidos. Atendia-o no
cartório, (Já se disse, funcionava em sua residência), a qualquer
hora, mesmo à noite, mostrava-lhe os processos, e até os de outros advogados,
gabando-se de ter corrigido um ou outro defeito de redação ou de direito, e,
até de ter ditado a petição, (estes escrivães por aí, não passam de pobres
culcornins, dizia), atribuindo-se a
autoria e muitas vezes por eles assinava, quando, por um motivo ou outro, não
podiam assinar. Davam-lhe autorização.
Imaginem o que não dizia de mim aos demais advogados, afim de ganhar-lhes
a simpatia? Arma de dominação. Disseminar a maledicência. Se queres reinar recorre à astúcia e à hipocrisia. Honestidade
e franqueza são qualidades dos mais fracos, são vícios que te levarão à ruína,
diz mais de um pensador, por isso que na política a ética deve ser
enxotada. Fez-lhe, um dia um convite. Ensinar no colégio, meu colégio, dizia. Menino inteligente, você deve contribuir conosco na educação desta terra. Não
é um dinheirão, mas ajuda nas despesas,
na gasolina. Que não era tão inteligente assim e também se achava despreparado,
não podia ensinar. Nada. Talvez fosse muito mais preparado do que muitos do
colégio, podia ensinar qualquer
disciplina. Não era bem assim. Estudioso, sim, não pronto pra ensinar.
Que decepcionado se mostrou o parvu.
Não estava acostumado a ouvir um não. Trazia todos debaixo dos pés. Que
ia pensar, não poderia dar uma resposta imediata, tinha muitos afazeres ainda.
Na verdade fazia outros cursos na universidade e não
queria perder seu tempo em salas de aula e correções de provas. Percebeu que
ensinar seria uma forma de vencer a timidez e se integrar à sociedade local,
por isto deixara a Europa, Salvador, mas perseverou na negativa e continuou arredio
aos encontros e festas dos jovens, a despeito de muito solicitado. Um pouco de
avareza também, não queria gastar, nem era de beber e, quem não bebe, fica
isolado do mundo. Elegeu-se a bebida como combustível da alegria, assim queria
Dionisios, e o homem, embora tivesse
perdido a noção de quem é realmente este
Deus, rende-lhe homenagem e o venera a todo instante, talvez mais do que o faz
com o Nazareno. Este, aliás, às portas do martírio se voltou para Dionisios,
escolhendo-o, na ceia, como o Deus
protetor de sua memória, quando consagra o vinho como o seu sangue.
Transforma o padre o vinho em sangue,
eleva o cálice, rememorando o Cristo?
Primeiro rende homenagens a Dionisios, a renovação constante do ser humano, da
vida. Não nasceu Dionisios, como Jesus, no dia 25 de dezembro, filho de um Deus
com virgem mortal Sémele? Não fez Dionisios, como Jesus, milagres? Não
transformou, como Cristo água em vinho? Não
foi como o Nazareno, peregrino? Não foi chamado Rei dos reis? Não ressuscitou
ao terceiro dia após a morte? Na comunhão comemos os corpo de Cristo, como as
bacantes comeram o corpo de Dionisios. lo! lo! Bromios! lo! lo! Dendrites! lo lo
Eleutherios! lo lo Enorches! lo lo Bacchus,
discípulo de Cibele, Também, Jesus, o que chamam de Cristo, o
ungido, era filho de Deus com a mortal
Maria. Isa Ibn Maryam. Com razão o bispo Ário? Cristo apenas, filho de Deus,
não o próprio Deus? Divindade de Cristo, um atentado ao monoteísmo? Ou Cristo
Jesus não teria existido enquanto corpo humano, como queriam os docetas? Ou como quer o patriarca Nestório?
Cristo Jesus, duas naturezas: a divina e a humana,
não podendo ser Maria a mãe de Deus? Pára, cabeça tonta, que tu não decifrarás
os mistérios da vida. Prende-te tão só a viver e já será o bastante. Quem perde
tempo nestas indagações está condenado a ser tido como louco e morrer na
penúria. Teus pensamentos não te dão fortuna, como a ações dos
negociadores. Se queres ser realmente
feliz não te dês às preocupações de Bento Espinosa, condenado pela Sinagoga de
Amesterdão em 1656, a esfregar na zunideira o oiro dos opulentos per ganhar o
pão de cada dia e ver seus escritos
trazer-lhe aborrecimentos e
excomunhão: “Pela decisão dos
anjos e julgamento dos santos, excomungamos, expulsamos, execramos e maldizemos
Bento de Espinosa… Maldito seja de dia e maldito seja de noite; maldito seja
quando se deita e maldito seja quando se levanta; maldito seja quando sai,
maldito seja quando regressa… Ordenamos que ninguém mantenha com ele comunicação
oral ou escrita, que ninguém lhe preste favor algum, que ninguém permaneça com
ele sob o mesmo tecto ou a menos de quatro jardas, que ninguém leia algo
escrito ou transcrito por ele.”
Continuação no Livro Noite em Paris, breve nas livrarias.
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