Contozinho
mais chulé. Ainda assim, vai ser mais lido que tuas maluquices. Tu vais ver. O ACF me
fala sempre. Não adianta escrever assim. Ninguém vai ler, eu não leio, imagine
os outros. Foi incapaz de ler uma página do Finnegans Wake. Também, pudera, já
começa com um tal de riverrun, rolarriunna que ninguém sabe o que é.
Rolembergue numa noite em conversas (Rua D´Assas, 16, Paris, quando perdi o emprego de
lava-privadas da Messageries Maritimes.(Duro levantar-se às cinco, quase sem dormir), se encantou com o enredo de romance, nunca escrito, de seu primeiro amor. Um amor não correspondido. Voltando à real dissera da vontade de se vingar dela, ele ficara muito chateado. Que não estragasse tão linda história. Geraldo, um cearense pai-d´égua, também
metido a escritor, impressionara-se com um conto, tampouco escrito, que se pretendia filme. Foi-lhe contado na pensão de D. Alice, esquina
da Mendes Junior com a Praça Rudge, Alto do Pari. O Cristo Assassino. Aconteceu com Lauria, aluno dos Carmelitas.
Um crucifixo de ouro prometido ao melhor aluno, dado ao menos merecido. Procissão,
do Carmo a Santo Antônio Além do Carmo. Me revoltei, tomei do usurpador um
crucifixo, grande, pesado, e atirei em
sua cabeça, prostrando-o no chão. Inda vejo sua cabeça ensanguentada, os olhos
esbugalhados como a sair das órbitas. Boca semi-aberta, expelindo filetes de
sangue. Esqueço partes e vou à frente,
relembro e volto atrás. Difícil para
mim, principio, meio e fim. Nada tem
principio, nada tem fim, algo sempre existe antes do principio e depois do fim.
Até admiro, esta capacidade, esta
loquacidade fluente que vai levando o leitor do muito simples e banal até o
paroxismo e o gozo com um final feliz. Bernadim Ribeiro não tinha tanta certeza
desta fluência da vida quando disse que o livro haveria de ser escrito como é a vida porque, das tristezas não se pode contar nada ordenadamente. Porque
desordenadamente acontecem elas. Não por acaso muitos começam uma história
por seu fim, como se estivesse desenrolando um novelo, cujo fim é o principio
de tudo. Outros ficam dando pulos para
frente e para trás, alguns contam histórias em paralelo como se nunca fossem se
encontrar. Talvez o cinema, com sua facilidade de cortar imagens, sobrepor-se
uma a outra, fundir-se com uma ou mais de uma imagem tenha influenciado esta
nova maneira de contar estórias. Olhemos
bem e veremos. O homem sempre foi assim. Incapaz de racionalizar totalmente
suas ideias. As vidas se repetem? Prometeu, Osiris, Buda e Jesus tem a mesma
história, em suas três fases, partida,
iniciação e retorno? Mas nem todos a contam da mesma forma. Não é atoa que
existem gramáticos tentando normatizar a fala, dirigindo-a para se tornarem compreensíveis.
Quem seria capaz de continuar um
história depois de abruptamente interrompido? Mesmo uma dor de barriga pode
mudar o fio de uma história. Não dizem que, ao receber noticias de
Portugal D. Pedro I estava cagando sua
dor de barriga às margens plácidas do Ipiranga? Nem mesmo os mais íntimos de
Deus, os mais santos se livram de cortes de raciocínio. Madre Teresa, dizem,
vacinava o bumbum de crianças em Calcutá, quando foi chamada ao telefone. Ao
voltar se confundiu, não sabia onde parou e perguntou: Em qual cu tá? Sejamos francos, um contozinho muito do reles, este.
Mas o pior é que todo mundo agora quer publicar suas
porcarias. Se eu facilitar, até D. Lela, perdida na cozinha do Ginásio Gilberto
Viana, lá em Itambé, vai querer publicar
receitas de seus quitutes. Quero, comer,
D. Lela, Quero comer D. Lela, gritava a turma no refeitório para desespero dos
padres. Polito, amado professor de matemática; Antonio Rocha de pernas tortas,
poemas parnasianos enaltecendo tardes primaveris e vôos de pombas que não se viam, nestes tristes trópicos, Vicentinho e Vicentão
brigando com os maiores do internato, no jogo da bola. Vejam só, já estão me acusando de já estar fugindo da regra
máxima do romance. A unidade. Hydra e outros escritos não teriam nada a ver
como os demais.
Ora,
unidade, lógica, como se a vida tivesse alguma. Só na cabeça das pessoas, não
na vida. Vida, pedaço de surpresas a ser
superada a cada instante. Não dá tempo
estabelecer caminhos, impor regras. Eles se nos impõem. O fato é que nem sei
mesmo se algo escrito foi sonho ou realidade. Se aconteceu na minha mente de
autor ou na dos personagens. Se o
personagem é meu próprio alter ego, ou representa alguém de quem aprendi a
história. Quem me disse que sou obrigado a esclarecer tudo isto? Quem me assegura
que o conseguiria? Deixemos correr a pena conforme leva a vida. Deixa a vida me levar, vida leva eu. E
assim vai outro aí. Talvez seja também um dos mais lidos.
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