sexta-feira, 30 de março de 2018

A VIAGEM OU A MANCHETE








Eram dezoito horas e trinta minutos na estação rodoviária do salvador. Janeiro, dez do ano de mil novecentos e setenta e cinco. Era um vai e vem constante dos que se apressam em viajar. Negócios. O homem corre sacolejando sua pasta e suas esperanças. Abre sua gravata ao calor tropical. A velha arrecada dos viajantes uma moeda: precisa viajar não se sabe onde. Nunca tem o dinheiro completo e vai-se deixando ficar interminavelmente. No ar, o zum-zum-zum da gente, as ondas curtas da Central de Operações, o estampido fumacento dos motores
Na plataforma C “Soldadinho” amava. Brilhavam seus olhos e seu coração. Miriam lhe dava mais segurança que suas armas.. Miriam abria seus lábios na sua boca. Nos seus ouvidos. Sussurravam. Iriam fazer uma linda viagem. Antes de chegar no Recife assaltariam o ônibus e teriam dinheiro para bons dias nos hotéis pernambucanos.
A calma dos que confiam em suas forças. Nem sequer se lembravam dos assaltos praticados na Bahia,  quando deixavam suas vítimas inteiramente nuas. Apenas apreensão. “Paulista e Branquinho” ainda não tinham se reunido a eles. Atrasaram-se, com certeza, iriam perder  o ônibus. E a passagem está custando tão caro! Não vale mesmo a pena trabalhar neste país: o dinheiro não vale nada.
Amavam. Os braços morenos encontravam-se e se entrelaçavam, num apertar e afrouxar quase rítmico. O ônibus entrou na plataforma. Recife. Duas, quatro, seis, oito mãos fortes seguraram seus braços amorosos. E trocaram -  bocas, inda abertas pelo beijo,  o conforto do carro-leito, pela desordem da camioneta policial
- Para a delegacia  – Grita, colérico, o policial, e  mais para si - hoje arranco tudo destes dois.
Sirena, fumaça e medo  fustigaram o ar. Quem depois conseguisse romper o engarrafamento de Salvador  e se aproximasse dos porões  da primeira delegacia, talvez ouvisse os urros abafados de um homem. Não. Não. Os assaltos sim. Não matei Negão Laranjinha, ou o soluço de sua mulher e o grito de ciúme :
 - Deixem minha mulher em paz, seus desgraçados.
A Bahia dormiu e acordou com o alarido dos jornaleiros. Preso o assaltante Soldadinho.















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